Decreto Lei 911/1969, suas alterações legislativas e a prática nos processos de regularização junto ao DETRAN dos veículos que são reintegrados ao patrimônio do credor.
A cena é sempre a mesma. Você vai em uma loja de carros qualquer com a intenção de trocar o seu veículo por outro. Os motivos diferem: Enjoou do modelo, da cor, quer um mais potente…O vendedor solicito apresenta as opções de troca, os mais potentes, os lançamentos, aquele que vai servir para a família toda. Só que que aí nasce o problema. Pagar o valor total do carro, está longe do seu orçamento.
Antes da década 60 a possibilidade da maioria dos brasileiros em ter um automóvel nem existia, mas veio a crescer com a intenção do governo em fomentar a indústria automobilística ainda insipida nos idos de 1960. Em 1969 foi publicado o decreto lei 911/69 que regulamentou de uma vez por todas maneira como se compra um veículo com o dinheiro de um determinado credor, geralmente um banco de investimentos e deixa o próprio veículo como garantia de que vai honrar as parcelas periódicas. O instituto criado foi o da alienação fiduciária. Por este modelo você empresta dinheiro do investidor, compra o bem que você deseja e deixa o próprio bem em garantia ao credor fiduciário. Só que neste caso, a lei é especifica em transformar o credor fiduciário em proprietário fiduciário até a quitação do contrato. Até lá, qualquer coisa que você vá fazer com veículo, além de dirigi-lo, depende de prévia autorização do proprietário fiduciário. Caso você não honrar as parcelas ajustadas no contrato, pelas alterações da lei 13.043 de novembro de 2014, o credor enviará a sua residência uma carta de cobrança com Aviso de Recebimento (AR) que ao retornar ao mesmo, se dá por constituída a mora do devedor, e o veículo pode ser alvo de busca e apreensão pelo banco, a menos que seja quitado a integralidade da dívida, ou seja, as parcelas vencidas e as vincendas. Este tema é pacificado pelo STJ. Recuperado o bem, pelas determinações contidas no próprio decreto lei 911/1969 pela redação dada pela Lei 10.931, de 2004 o Detran se obriga a emitir um novo certificado de registro em nome do credor, ou a terceira pessoa que ele indique. É bem o que determina em seu Art. 3º:
“Cinco dias após executada a liminar mencionada no caput, consolidar-se- ão a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem no patrimônio do credor fiduciário, cabendo às repartições competentes, quando for o caso, expedir novo certificado de registro de propriedade em nome do credor, ou de terceiro por ele indicado, livre do ônus da propriedade fiduciária.”
Repartição competente neste caso, é o Detran de cada estado. O poder judiciário já decidiu a tempos, que comprovada a recuperação do bem pelo credor, deve ser emitido um novo certificado de registro em nome do banco e que nenhuma restrição ou burocracia pode obstar este procedimento. O hábito de entregar o veículo a terceiro e segurar consigo o CRV original, habitual de muitos logistas de veículos por exemplo, não vai impedir que após a retomada do bem pelo credor o CRV seja emitido em nome do banco. Antes, pode se constituir em uma prova de má fé de quem o sequestra, a fim de não honrar o contrato.
Ainda dispõe sobre a matéria a lei 10.931/2004 que fala sobre o patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias, Letra de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Bancário, altera o Decreto-Lei no 911/1969, de 1o de outubro de 1969, as Leis no 4.591, de 16 de dezembro de 1964, no 4.728, de 14 de julho de 1965, e no 10.406, de 10 de janeiro de 2002, e dá outras providências. Conforme foi mantido nas alterações introduzidas pela Lei Federal nº 10.931/2004 o Art. 66B, § 3º, delimita claramente a entrega de direitos ao credor quando da oferta da coisa móvel como garantia de divida regularmente contraída e anotada em contrato próprio, pois de outra forma favoreceríamos enormemente a inadimplência e a má fé nas transações de crédito, colocando em risco a própria economia brasileira que orbita necessariamente em torno da alienação de bens móveis e imóveis, assim o artigo (55)66B, § 3º, esclarece:
“É admitida a alienação fiduciária de coisa fungível e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, bem como de títulos de crédito, hipóteses em que, salvo disposição em contrário, a posse direta e indireta do bem objeto da propriedade fiduciária ou do título representativo do direito ou do crédito é atribuída ao credor, que, em caso de inadimplemento ou mora da obrigação garantida, poderá vender a terceiros o bem objeto da propriedade fiduciária independente de leilão, hasta pública ou qualquer outra medida judicial ou extrajudicial, devendo aplicar o preço da venda no pagamento do seu crédito e das despesas decorrentes da realização da garantia, entregando ao devedor o saldo, se houver, acompanhado do demonstrativo da operação realizada.”
Assim sendo, oque resta após a retomada por comprovação da mora, seja por liminar de busca e apreensão e reintegração de posse, ou por entrega amigável, o veículo deve ser vendido em leilão e caso sobrar algum residual além daquilo que o financiado devia ao banco então o banco deverá ao financiado. E para que a venda seja feita a terceiro e o veículo possa enfim ser registrado no DETRAN então antes terá que ser emitido um novo registro em nome do credor fiduciário.
Para que o registro seja feito no DETRAN em nome do credor fiduciário, em cumprimento a obrigação legal do órgão em fazê-lo, basta que seja comprovado por meio de processo administrativo próprio naquele departamento, onde constem os documentos que comprovem a retomada, quer sejam a composição entre as partes, a tal entrega amigável ou a determinação liminar juntamente com o auto de entrega amigável.
Sobre a matéria o STJ já se posicionou a respeito da necessidade do cumprimento das normas de alienação fiduciária afirmando que isso é “importante ferramenta de fomento à economia”, o que de fato é, pois a inadimplência absoluta de um povo é o início da derrocada da economia de uma nação, como vimos no exemplo da bolha imobiliária americana da última década.
Valmir Moraes.
Advogado – OAB/SC 53.529.